Enterro
Como se torna difícil, às vezes, tomarmos uma posição correta. Pois nem sempre ela abarca os portões da vida com os ramos da alegria. Engana-se muito aquele que pensa que a paz vem guarnecida em uma carruagem de cetim e cavalos de açúcar. Pois a paz se dá apenas àqueles que querem tê-la e não é simples. A paz se coloca preço, ela se espalha como cartas de um baralho e nos deixa livre para escolhê-la se quisermos, mas ela nunca está desacompanhada: a paz tem um preço.
Hoje me pergunto o que não se tem um preço. Não me refiro ao sentido capitalista da palavra “preço” (como algo que se pode trocar por dinheiro). Coloco essa palavra na posição de entrega, de escolha, de caminho a ser seguido. Tudo o que se tem é a opção. Sua opção é seguir o coelho branco ou acordar para o pesadelo do real.
Descobri que os meus sonhos não são compatíveis a esse mundo. Hoje, deixo para o passado e para a masmorra mais alta desse castelo de cristal um sonho que eu nunca mais terei a oportunidade de realizar. Esse sonho que enterro entre os tijolos dessa parede para que nem como um fantasma de lembrança me atormente.
Aprendi o quanto é difícil tomar a decisão certa. O quanto é difícil sacrificar parte de mim para salvar algo maior. Sentia-me forte até ontem por acreditar que eu era um pouco altruísta. Hoje reconheço minha fraqueza, a minha condição humana. Admiro os homens que se desapegam dos bens materiais e das coisas mundanas... Admiro aqueles que sabem o que é amar, mesmo nos momentos mais difíceis... Admiro aqueles que sabem falar, mas admiro ainda mais aqueles que sabem ouvir. Posso parecer palavras comuns nesse instante, mas nenhuma palavra é comum quando se tem na pele as cicatrizes dela, não só como marcas para até o fim da vida, mas também como molde de princípio.
E o pior de tudo isso é perceber que o mundo não quis parar por minha causa. O meu sofrimento não significa nada para aquele que governa o meu coração... Talvez palavras sejam ditas... Talvez lágrimas rolem sem pestanejar o titilar dos segundos passados, que absorvem o silêncio, transfigurando-o em desabafo dessa alma que roga um espaço.
Não tenho com quem contar... estou sozinho e acho que é esse o meu destino, por mais que isso doa, só tenho provas que é assim os dias que estão por vir. Em outrora sonhei com algumas cores que ainda não existiram nessa paleta, cheguei a me iludir que elas viveriam por aqui... doce ilusão, carregou para longe parte dos meus sonhos, parte de mim... Não tive escolha, não pude seguir o coelho branco que nem Alice fez.
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